Anos se passaram, uma mudança previsível de todas as vias dessa casa. Quase vinte anos para construir o primeiro andar, uns cinco para aumentar a sala e diminuir o corredor onde eu rodeava a casa de velotrol. O jardim já não é o mesmo, o chuveirão não existe mais, a churrasqueia melhorou bastante tomando ares de mármore e madeira robusta. O quintal deixou de ter um coqueiro e a varanda uma palmeira. As pequenas rosas e margaridas ficam na lembrança rápida por onde passava, o canteiro servia de recuo para conseguir pegar os coelhos. O portão deixou de ser de madeira e o muro também, o gramado da varanda também foi embora e deu espaço a um grande salão de pisos brancos e flores azuis. O pequeno quarto virou uma sala, a sala continuou sala, a cozinha só se serviu de fogões e geladeiras novas. O banheiro ficou pálido, espelhado e mais bonito, lá em cima agora existem três quartos, o corte da planta se fez como em baixo pois as vigas só seriam felizes assim. Embora uma varanda tenha se estendido lá em cima com um ar gostoso e vista esquisita. Não vejo mais a grande árvore que ficava a frente da casa, as linhas bem amareladas ao chão da rua, as pequenas folhas que elas depositavam ao chão. Não vejo mais as crianças, os refrigerantes que ia comprar no vizinho a frente, o pipoqueiro passar... Não me vejo na calçada o dia inteiro brincando descalça.
Na minha casa muita coisa mudou, mas o engraçado é perceber que as portas são as mesmas de sempre, abrigaram meu choro e meu riso infantil, minha euforia pré-adolescente, minha revolta e indecisão de mocinha - que carrego comigo ainda, bem forte - e hoje elas apenas escutam minhas músicas altas, o meu passear na madrugada, meu silêncio e minha solidão. As vezes riem com meu riso, ou das minhas piadas esquisitas quem sabe das minhas danças matinais?. Por outras me fecham por fora para ver que não é a minha vez, enfim, as portas continuaram as mesmas. Apesar de muda-las de lugar, são as mesmas de sempre. E por um segundo, sem querer até me dei conta de como foi bom perceber isso.
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