quarta-feira, outubro 29

Lá estou eu.

Quando me deparei, abri os olhos ao sol de meio dia, os poucos, sem saber onde estava. E galpões me rodeavam, um cais de tríplice naval. Um homem atropelara uma velhinha, que gemia ao chão e ele por sua vez, idoso tanto quanto, balia de medo.
Ficou para trás a visão, apesar da cabeça aparente na janela. E de volta uma moça entra cheia de livros, ela não tem troco. E o cobrador lhe diz para esperar mais alguns pontos, então ela senta torcendo o nariz. Mais a frente um cruzamento de estrangeiros baianos, estrangeiros multifacetados e estrangeiros incomuns. Um homem nu atravessa o passeio, uma baiana balança
suas mil saias e anáguas a frente de seu restaurante de frutos do mar incandescentes, cadeiras ao ar livre e uma imensidão de ninguém. Ao seu lado quatro vagas são para o Projeto A, sete para o banco Safra e nove para os demais. Atrás um estacionamento pago, completamente vazio. Mais uma parada de engarrafamento, a temperatura é de trinta e um graus e a umidade do ar se perdeu no além. Uma menina de roupa rasgada passeia sobre as esquinas, passa pelo meu encontro e desaparece dentre becos. Derreto na cadeira, guardo mais um livro que esqueço de ler por preguiça até que, um velho atravessa o passeio e toma minha atenção com seu chapéu de marinheiro, acena para o baleiro que lhe diz bom dia com aceio. O baleiro por sua vez alimenta um cãozinho de rua que se sente satisfeito com um pedaço de pão com mortadela, o mais delicioso manjar de seus dias. Agradece com o balançar do rabo. Acima um helicóptero sobrevoa os castelos antigos, as ruinas do centro e os animais em sua órbita. Desce um pouco mais e faz as folhas dançarem passos tão marcantes como nunca haverá de ser. E logo em baixo da mangueira, um garoto passeia com sua amada. Segura seus livros e lhe conta algumas baboseiras, é um romântico sagaz. Atravesso finalmente a avenida, olho pra cima e o Lacerda me observa ou ao contrário, quem sabe. Uma ladeira de casas esquecidas e roupas penduradas, engraçado o outdoor com um jeans desbotado ao secar sobre o criador de necessidades. E lá estou enfim! a baía é linda, a água é azul como o infinito céu. O forte reproduz a saliência de minha saudade, a saudade contida, antiga. Não pisco nem falo, mas ouço. E atrás de mim o cara que reclama de ligações da esposa de alguém, mas não, dessa vez o marido ligara, e perguntou quem era o tal do número. Disse apenas ter retornado, pois não sabia de quem era a ligação, e minha curiosidade sonora me acertou de tal forma que pude perceber a raiva contida no seu ranger dos dentes. Casamentos estranhos, pessoas tão iguais. E sim! sim... passou a baía, linda, regente de minhas esperanças, meus sonhos. Por parte a água é tudo que me conduz, me firma as escolhas.
E na Praça da Inglaterra já são doze e trinta e sete, e eu estou atrasada novamente. Rápido atravesso Londres ao corredor de implacáveis comerciantes, desço e subo olhares, vidas a se deportarem de minhas ânsias, e até que me rendo a um outro cãozinho a deliciar-se no frango que gira, gira... e gira. E onde estou? Campo Grande chegou, a praça de meus sorrisos, os pombos comem milho no chão, as crianças correm pelos ladrilhos. O caboclo acena aos céus e a estátua espera que a água escorra por seu jarro. Desço próximo a minha Vitória, ao meu chegar. E correm estudantes tão atrasados quanto minha hora perdida, e rio de igualdade. O telefone do meu antecessor toca novamente, dessa vez ele desliga o celular e diz baixinho " chega ". E então levanto do meu sentar, escorro a mão sobre o bastão metálico, puxo a corda da estadia e desço as escadas do itinerário.

Lá estou eu.

Burra

Esse meu carinho desmedido,
essa minha falha no coração,
essa meu pensamento pré-disposto..
a sempre te dizer não.

Canhoto

Era teu o meu compromisso,
de parte número e contradição.
O que era meu lhe passara,
mas me faltara, aos montes.

Esqueci de como dói,
dói demais no bolso,
essa maldita dívida..
só por causa de um mero alvoroço.

terça-feira, outubro 28

Lua, espada nua.

Sobre a sua canção, a doce sinfonia do teu olhar, sobre a neve que esconde o primor do teu amor.
Há, de tudo e em tudo parte de ti. Como se adivinhasse o que se passa aqui dentro, e exaltasse minhas memórias. E um trovador azul pudesse dizer a todos o que sinto.
É a mais pura verdade, de certo que que nem tudo é seriedade. E errante é o pecador que se diz obstinado, sem estima. Uma estima coadjuvante de si, para si... corrente. O delinear dos passos esquecidos, rejeitados.. o obscuro que se esconde na simples falta de luz. E a mente que apenas clama por um pouco mais de alimento... suspira.

sábado, outubro 25

Pintinhas

Pintas, lindas.
Duas perto de seus olhos,
em um linear vistoso,
em uma perda... severa.

Contorno

~Temo por partes,
até que se prove o contrário,
temerei por completo.

E assim vou escutando,
pensando e falando,
o que me convém.

E até que chegue,
a hora de partir,
só lá, saberei.

sexta-feira, outubro 24

Rápido

Hoje é sexta,
e a minha vida
se perdeu em horas.

me joguei em minutos,
em dias terminei.
e aos suspiros e esperanças..
digo que ainda bem.

bem rápido.

terça-feira, outubro 21

Oh, cant you see?

No táxi o lamento, e a flor no meio da avenida, chamara atenção. Desceria naquele momento? Não só uma flor no meio de pedregulhos, mas uma esperança erguida no nada. Mas a falha seria maior, mas o medo seria eminente. E no som um every breath you take, dizia algo que não poderia soletrar. Adeus, minha mais bela flor... até um dia, que voltarei e irei recolher-te sob meus braços, pele... coração.

A sua presença

Toda vez, impune.
Esse teu vício,
essa sua condição.

Sempre igual,
esses motivos,
tão errantes.

E vai privar-se,
de si mesmo..
e da outra,
que te acompanha.

Quando o amor diz,
os outros se calam,
ouvem quietos..
e falam baixinho depois.

Não passa

Esperei você passar,
por dias e dias,
semanas...
por horários estranhos,
e madrugadas vivas.

Esperei passar
sob meus olhos.
Mas não passa,
você não passa...
não quer passar.

E espero, lamento..
e rogo,

tem de passar.

Gótia

Nem precisaram recusar-te,
já és recusado sozinho.
Planta sua erva daninha
em eiras baixas.
Seus louros murchos e
suas... suas falhas.
Apesar desse cálice que
brilha em suas mãos,
apesar no resplandecer
de todas as manhãs..
ainda és, sem precisar..
sem falar, nem intrometer,
um recusado.
um pobre diabo,
necessitado de problemas.

Tempo, tempo, tempo... tempo.

Aos teus dias,
mais dias.
A tua glória,
lembrança.
Aos teus fados,
calmaria.
A tuas dúvidas,
mais perguntas.
A tuas falhas,
só tempo.

Tempo, tempo, tempo.. tempo..

O veneno de Clarice

Clarice jogou seu veneno
em doses medidas.
Aos poucos o líquido
entrou goela a baixo,
rasgou suas entranhas,
e adentrou seu coração.

E conseguira então,
o que tanto queria.

Típico

É madrugada e eu aqui de novo, jogada as traças.
Perdida num copo de não sei mais o que,
fingindo brincar de sorrir ao léu.

Mero retrato da distração,
daquele que não se pode emoldurar.
Para não lembrar...

domingo, outubro 19

Jardim imenso

Desistiu de aparecer sob olhos. Perdeu o ar de solidão altiva e sorriso forçado. Quem dos quais e quando, quando foi mesmo? Ah sim, a poucos instantes. Deixou de ter cores e amores,
não por descolorir ou não amar, por redigir o vazio ou por reafirmar o infinito. Mas por agraciar o que é introspectivo, seja lá o que se faça compreender disto. Seja lá a compreensão uma visita a um jardim imenso, cheio de labirintos forçosos e medidas inexatas. De flores púrpuras e espinhos venenosos, do ventre verde e extremidades secas... até o fim, do fim.

Chuva estranha.

Chuva estranha,
Me lembra dias quentes, onde desaguava sobre a areia e contava estrelas a sós. Onde no céu desenhava uma casa, uma varanda... e a imensa solidão. Ouvia o reclamar dos céus, a loucura do mar, e a imensidão do mundo. Quem era eu pra dizer o que quer que fosse? se o universo todo conspira a um calar, se só a verdade oculta da imensidão e pode me dizer se o infinito merece preceitos.. E onde não há companhia? sem o esvair de todas as forças.. de todos os males grosseiros, todas as dúvidas, incompreendidas. E retorço o nariz, desaprovo a latência e jogo ao mar todo o grão que sobrou das palavras ao léu, todo esforço não tão em vão, mas necessário.

Quem me dera

Quem me dera,
me ter por um dia.
Assim saberia da desavença,
e causaria uma reconciliação.

Quem me dera,
me ter por um dia.
Descobrir se existe,
esse tal coração.

Quem me dera,
me ter por um dia...
e acabar com essa agonia.

quinta-feira, outubro 16

A criança

Ganhastes um brinquedo, pequena criança.
Nele entenderás suas tolices, resguardará seus segredos e vais compreender suas dores. Um cubo mágico, onde preto e branco discernirão sob tuas perguntas. Talvez entenda criança, coloque seu vestido azul e vá até a porta, me diga o que vê. Se gosta do azul do céu, dos fios que cortam o além, das luzes estelares em terra, dos grãos vistos na mão enrugada. Ou mentes, pequena. Não gostas de gritos, nem dos louros murchos que dizem ver em você, e tens medo do escuro, não aprecia abraços secos nem gosta de leite.
Então pequenina, jogue seu dado magnético de duas fontes ao chão,
e diga-me; o que você vê?

Miss Tigela

Depois que mamãe enfileirou os ingredientes, me recostei sob suas pernas.
O leite, os ovos, o açúcar, o chocolate e a farinha de trigo.
E eu aqui sentada ao chão, pequena, minúscula.. a esperar pela tigela.
Puxo o pano de sua cintura, enquanto ela bate a misetirosa massa,
vou logo a apressar-lhe de meu querer, meus dedos estão prontos..
meus olhos compenetrados e minha boca formiga de vontade.
Mamãe me presenteia então, sento ao chão sorridente,
meto os dedos na calda amiga e levo a boca com vontade.
A boca suja de chocolate... ahh que felicidade


ahh, que saudade.

Tûdibáum

Um adeus guardado no peito,
que agora ressalva o abraço,
uma ida de volta desmarcada,
e um livro de recordação.

Seja bem vinda a sua nova vida,
boa sorte, boas novas..

tûdibáum.

Ao soar do galo as onze

Por um segundo senti a nostalgia de ser feliz, recobrei-me quando um galo as onze da noite gritou e sem saber se o mundo me daria respostas, ela subiu, sentou-se a meu lado e recostou suas mãos. Não tinha pernas, e eu não tinha coração. Pedi que me ensinasse a recobrar o sorriso, e ela nada me disse, só me mostrou as maçãs do rosto.
E eu não soube como responde-la a altura...

terça-feira, outubro 14

Placa

Depois de tantas vezes,
por cruzar ruas e vielas frias,
tombei com uma placa,
que me dizia, Pare.

Apenas, Pare.

segunda-feira, outubro 13

Oitenta dias no hospício.

Assinei o maldito papel que me prendia nas celas dos alucinógenos, para alguns isso seria o paraíso na terra e para outros, o inferno do submundo. Sim, eu enlouqueci.
Dois dias dormindo no chão fizeram da minha vertigem da cama ressoar como loucura, e gritou tão alto a tal forma, que não sabia mais ouvir a minha própria voz. Quando descobriram que não chão desaguei por setenta e duas horas, logo fizeram, em alguns minutos a repreensão do meu ato sigiloso. Estava pálida, imunda por dentro e serena por fora, como sempre estivera. Caso esse que se fez presente em anos afinco, contemplando e assumindo cada papel que assumira na vida, desde a primogênita consciente a inconsequente consumidora. Os dedos retorcidos e o cabelo desgrenhado, a pouca roupa não fizera frio, nem calor... nem nada.
Quem me achou perdeu a paz consciente, perdeu o brilho por aquele ser de grandiosa plenitude, de sorriso alargado e brilho no olhar. Quem enxergou o contorcer do corpo amarelado soube distinguir até onde a vida lhe toma lucidez. E os olhos opacos perderam seu tilintar, o sorriso esquecido foi trocado por uma boca entreaberta. Sentia fome, a fome de descobrir o que me fez partir, o que me pudesse responder as incessantes perguntas, e talvez pudesse acalmar meu coração. Pois parti muito cedo, cedo demais para os demais. E parti sem adeus prévio, sem uma carta calorosa, sem mais.
Mudei de ares como uma carne que sai do freezer, meu degelo era lento e a fome que os médicos sentiam - de fato descobrir meu cativeiro - era imensa. Perguntas e açoites, como açoitavam o meu pensar, pois não pensara, não retrucava, vegetava. Um corpo sem alma, um descolar do pensamento vivo, assim pude enlouquecer em paz. E depois de tantas tentativas, de muitos medicamentos, o meu sequestro foi eminente, e o sequestrador desconhecido. O desespero dos que me encontravam era indolor, nada me trazia de volta, nada a mim ou de mim voltaria. De fato meu mundo se perdeu, pediu um paraíso falível, e conseguiu. Meus sonhos eram vazios, minhas dúvidas não me questionavam, não tinha nada, nada me tinha. As mãos carregava o cobertor que me cobria as noites, a única coisa que de mim não tiravam. O retorcia como quem pede socorro, sem um sussurro de lucidez, sem uma palavra estranha. O calar dos meus lábios só traziam mais médicos a minha volta, e menos conhecidos ao meu encontro.
Uma semana sem dizer uma palavra, dois dias sem tomar um banho direito. O quarto me parecia aconchegante, divisório e fedido. As cochas se amontoavam sobre mim, quem colocou tudo isso? Talvez sentira calor, talvez. Dormia por exatas oito horas, quatro pela tarde e mais quatro pela noite após as duas da manhã. O único despertar era dos olhos, e a única coisa que reclamara era o adormecer.
Um mês se foi, os comprimidos se tornaram aliados. A síntese de meus sentimentos, degustados sobre uma língua quieta, sobre cordas esquecidas. E o olhar opaco se dilata, viro um bicho. Saio as seis da manhã a procura de qualquer coisa, e no jardim encontro um compatriota. Pierre diz ser Monjardim, Pierre diz ser quem quer que seja, a não ser Pierre. E ele se tornou meu eu lá fora, meu eu perdido. Em Pierre minha alma recostou, e ele falara por meu corpo. Horas e horas sem sequer um balbuciar, e ele vai até o chafariz se embriagar novamente, bebe sedento a água suja, molha a barba branca, molha os cabelos grisalhos, molha meus pés. Agora Pierre é líquido, é deslizante e maleável. Assim como minha alma, colada a seu dorso.
Três da tarde, o relógio amplia a hora de adormecer, mas não sei como voltar a meus quartos, tantos quartos que mudei pela falta de cooperação. Então adormeço na grama, e Pierre resguarda meus sonhos. Coloca folhas a minha volta, e diz que o ciclo da natureza jamais deixará de me guardar. Agora Pierre é o mundo, a natureza..
Depois de religiosamente encontrar com Pierre todos os dias, ao sexagésimo nono dia, ele daria adeus ao mundo de adeus, a fruta mais madura do pomar de Deus se esvai num sorriso matinal. Pierre se deitou sob meus pés e os acarinhou, despedindo-se. E uma folha seca recostou sobre minhas mãos, me dizendo em verso; " um dia foras verde, e um dia, seca será. Mas só o tempo poderá secar a folha solta, só o flanar da folha ao chão a faz secar, garota resista, volte a esverdear" e Pierre se foi as sete e quarenta e cinco, e uma lágrima escorreu as nove e meia, depois que seu corpo saiu a frente do meu mirar. Seria Pierre meu desperto anjo?
Pela décima vez mudei de quarto, agora a minha janela dava para o jardim. Depois de escorrer o lamento por minha alma morrer, novamente desterro meu corpo, perdido. E a folha foi comigo, em meu bolso cheio de vazio ela contemplava o algodão surrado, e se despedaçava aos poucos, contando as horas de sumir de lá. Eles aos poucos tentaram por Pierre me resgatar, deixaram os remédios apaziguados, e me fizeram tomar sol um pouco mais. Depois da segunda morte de minha alma, meu corpo se esvaiu junto, só recostava o fado vivo a cama desfeita. E meu eu morto chorava do outro mundo, me pedia um carinho obsoleto, uma parcimônia de minha parte, que eu esqueci como redigir.
E no septuagésimo quarto dia, uma luz entrou em meu quarto, intensa e reveladora. A brisa da manhã me chamara a janela, e eu soube responder-lhe. Tentei com as mãos recobrir-me da luz, e do pó mágico que saia de sua manhã calma, sem sucesso, porém um sorriso me extornou. Voltei a cama e dormi, quebrei o laço de minha rotina. Seria Pierre novamente?
Dormi um sono de seis dias, um cansaço intenso me conduziu a letargia. Um coma residente e inexplicável, pela ciência humana. Mas ao acordar, despertei. Meus olhos medrosos se retorciam aos quatro cantos daquele quarto branco, de paredes brancas e janelas em tom pastel, acordei ao respirar que me faltara, ao medo que me consumia, de volta a mim. Minha alma retornou a meu corpo, finalmente. E os tubos em meu braço me doloriam as veias, e me deixavam tonta. Retire-os e levantei da cama, vesti o agasalho de sabe-se lá quem, andei no corredor sem destino e um pouco inconsciente, até a sala mais próxima. Bati três vezes, e antes do soar da quarta um sentinela me interrompeu, surpreso e assustado, perguntando-me o motivo da visita. Então de mim surgiu uma voz esquecida, um apelo do som, e disse-lhe que queria a minha nova velha vida de volta, dicotomicamente feliz. E o sentinela sorriu, pensou que minha loucura se aprofundasse.. Até que a porta se abriu, meu pai me puxou para dentro, para que pudesse me explicar, o abraçar e ver se o meu eu retornou de verdade.
E meu pai ouviu o meu discurso de minha velha nova vida, e me ouviu contar sobre Pierre e sua razão emocional, do meu eu perdido e morto, da minha alma morta duas vezes, e o retorno ao santuário do meu corpo.
E meu pai nunca me achou tão louca, meu pai nunca me achou tão perdida...

Mas nunca minha lucidez fora-me tão breve, nunca fui tão verde.

Não, rapaz.

Não pegue como se fosse sua,
não se pertence a quem quer que seja.
Minha fala diz quem sou,
mas não diz tudo.

Não me venha com bons ares,
sei da dor que atravessa seu peito,
sei da falta que o mundo lhe faz.
E saiba que no meu a dor é eterna..

Então me diga o que é pior;
O seu remorso ou a minha falta de paz?

Um dia vamos olhar para trás...
e saberemos, talvez.

Infância

E no ar, as cores perdidas,
cores de minha infância,
nas ruas esquecidas...
e em meu peito lembrada,
a saudade gostosa..
saudade que me mata.

O fado de Eva

Ela te amou dos pés ao nariz,
só pra não admitir te amar por inteiro.
E te amou por te esbarrar,
te amou até quando infeliz.

Ela te amou sem saber,
te amou sem querer,
te amou sem admitir.

Ela te amou em palavras,
te amou em olhares,
te amou em zelo.

Ela te amou em suspiros,
te amou em gemidos,
e te amou em lágrimas.

Ela te amou quando,
ela te amou onde,
ela te amou porque..

te amou no olá
te amou no adeus,
te amou quando não devia.

Ela te amou tanto,
que desse amor,
só sobrou nostalgia.

A mesa

A mesa não quer mais,
ficar submersa a tanto.
Ficar reduzida a tão pouco,
carregando o fado de carregar.
Embrulhada no centro da sala,
conduzida por toalhas esdrúxulas.
A mesa não quer mais suportar,
tanta coisa desnecessária...

Instante

Cheguei em casa,
abri a porta
e corri as escadas.

E você estava lá,
e eu aqui, com as
chaves na mão a te olhar.

Deitado na cama a dormir,
um sono cintilante, feliz.
E eu sentada na cadeira a pedir,
Deus, consuma esse instante...

Carta

Escrevi uma carta tediosa,
nela disse o que sempre digo,
como está e como estão todos?
deixando o que me falta, faltar muito mais.

escrevi umas palavras xulas,
das quais me arrependo tanto,
da forma que tudo transcorreu,
fica assim o meu pranto.

escrevi o desgosto em palavras,
depois de enviar a minha carta,
descrevi nos olhos a culpa..
e a dor, que no peito se exalta.

domingo, outubro 12

acabou, meu velho.

O meu bolso vazio agora implora,
por mais um, só um.
Que comprasse o tempo,
e voltasse a fita.

Para quem diria adeus com amor,
ou daria um abraço desmedido.
Que cobrisse alguém de carinhos,
e esquecesse a raiva, o rancor ...

Que contasse uma estória anil,
e fosse colocar o café sobre a mesa..
e visse as estrelas ao tilintar dos céus,
e dormisse no sofá de cansaço.

E acordasse antes do amor,
que o visse mexer os lábios ao dormir,
e o cobrisse pois o dia está frio,
e cobrisse o peito... do próprio frio.

Acabou, meu velho.

Running star

Ele tenta como pode,
e ela insiste em se afastar..
talvez ela não se afaste,
só ele que não sabe procurar.

Eu te disse

Hoje a tristeza talvez domine.
E implante suas lástimas em todo meu ser.
E fique ao redor do meu corpo estático,
e me abrace apertado...

sábado, outubro 11

A diferença

Ela prefere o tímido,
pelo tímido ela sente amor.
pelo tímido o coração palpita..
por ele tudo são suspiros.

Pois o outro é só sensação,
só o corpo reage. Só a boca não deixa,
o gosto esvair a vontade.
E vai até onde os lábios cobrem,
até onde os braços deixam,
e envolve, te envolve e desmancha..

Ela realmente prefere o tímido.

Dele

Sabe, querida.
Te vi a muito mais tempo,
você lá fora contente..
e seu cabelo contra o vento.

Eu te observava atentamente,
pra quem sabe, ler seus lábios.
Descobrir o segredo do teu conhecer..

e beijar essa sua boca...

(que vontade) .

Não quero saber

da sua bondade,
do seu medo,
da sua verdade.

do seu chorar,
do seu ardor,
da sua saudade.

da sua triagem,
do seu amor,
da sua vida.

não quero saber,
que me falhe a curiosidade,
de saber da sua vida.

quarta-feira, outubro 8

O copo

Um copo vazio,
do qual procurei,
matar minha sede.

um copo tão fundo,
que me iludi,
do açude que esperava.

e morri de sede.

L'amour

cansei de te procurar,
de te esperar,
te lamentar.

cansei de persistir,
de não conseguir,
de lutar.

cansei de você,
de tudo que representa,
que fique tudo onde está.

Congestionado

Não prestei atenção,
quando vi, já estava indo.
Olhando com ar de chacota,
aos que do outro lado atravessavam.

E pensei comigo por um segundo,
se o sentido fosse alterado?
E então cai em mim e percebi,
que estava longe de chegar...
Eu é que estava do lado errado..

Viciado

Eu preciso, cara.
só mais um gole,
só mais uma vez..
preciso lembrar
daquele gosto,
daquele sabor, outra vez.

terça-feira, outubro 7

Eu queria!

Eu queria!

Dizer por dizer,
falar por falar,
tocar nos teus cabelos.
poder te beijar.

E dizer que te amo,
que não mais te enxergo na rua,
em todos os corpos que de longe
atravessam os ventos.

Pois não preciso,
não preciso da doce e ilusória falta,
e sim da pura e refrescante realidade,
de ter a sua vida na minha,
de ser por você, pra você , toda e completa vontade.

De sermos nós e apenas nós,
eu, você e o nosso amor, de verdade.

segunda-feira, outubro 6

Ledessa

Teus motivos e minhas falhas,
sorriem um ao outro.
dão as mãos no meio da rua,
não se esquecem por um segundo.
Entrelaçam seus nomes,
recostam sua importância,
Moram juntos, incluídos.

E ficamos, como estranhos.

Ainda sim, volte sorridente.

Crendices tolas,
assolam os dias.
contar estradas,
fazer pedidos
e pular algumas vezes.

Tocarás aquele muro,
e seus sonhos vão ser,
tolos e esquecidos
a apenas dois passos.

Olhe para o universo,
e verás nada além,
nada além de tudo isso.
Disso tudo lembrará.

Cruze os dedos, peça por ele.
Mentalmente seja, faça, urre.
Feche os olhos e os aperte,
a força do contorcer fará.
E tudo será eminente, querida.

Você sequer saiu do lugar.
E foi onde qualquer um fora,
e ainda assim, volte sorridente.

O anel dele

Me diga, menina..
como chegar a teus lábios?
esses que riem de mim,
de minha tolice masculina.
de minha tímida pessoa,
e latente vendaval.
leia minha mente querida,
e verás meu desejo por ti.

domingo, outubro 5

Voyage

Pegou sua maleta, relógio e coração. Juntou os pedaços do mesmo, cada estilhaço que largara pela casa, num canto qualquer, um vasilhame de cera ou debaixo dos cobertores. Minuciosamente beijou cada cômodo com os dedos, olhou-os com devido respeito e imunidade temporária. Nenhuma lágrima recostaria seu ardor sobre o velho assoalho.
Desceu a escadaria, enorme e barulhenta. O barulho de seus sapatos lhe ensurdeciam, e a crença do sorriso nos quadros o apaziguavam em diminuto. Diminuto vazio, logo substituído por um grito sufocado. Mudança de latência.
Fechou portas e janelas da cozinha, frestas e armários na sala e versos e poemas de seu coração. Trancou o que lhe restara em quartos estranhos, lembranças amargas e mágoas discretas. Como uma lágrima que cai quando se deita de lado. Impune, ela desce para dizer olá.
As chaves se amontoam, o molho lhe pesa a calça e a mente esquece o molho, agora sem sabor.
Cretina rotina de mil ventos, depois de abrir os portões. Andar no frio é abrasador, quando as temperaturas são iguais, nada se sente.
E na maleta seus pertences, cartas de amores improváveis, escrituras pela metade, restos de um alguém que se foi, restos de um si que faleceu. Uma caneta estourada, cansada de descrever o extenuante desencontro de seu curador. E derrama sua tinta azul sobre o chão acinzentando, e derrama o que escreveria se houvessem motivos, se quisesse escrever.
E diz adeus ao seu próprio adeus, ah Deus... perdoe-me. Está indo, vindo a marcar sua visita ao inesperado, e de espera, as três será sua consulta. Breve e indolor.

Na cama

Que chova de mansinho e fiquemos, nós.
Aqui onde o mundo não existe,
o tempo não resume,
e não há solidão.
Onde a chuva não nos toca,
o fim tem recomeço,
e a paz tem sobrenome.

Flores não..

Flores não murcham à toa.
Só quando o sol se vai,
Quando lhe arrancam um pedaço.
e lhe retiram o chão amado,
e do avesso sua alma chora.
Repuxam suas raízes e lhe implantam,
no vazio de existir sem terra...
..e assim, murcham.

Talvez sim

O recuo no olho esquerdo
e a trégua da realidade.
O impulso referido,
a calma requerida.
Talvez sim, felicidade.
Tão longe, tão rente.
Tão presente e austera.
Diminuto sorrir,
imenso sentir.

Talvez, sim felicidade..

sexta-feira, outubro 3

Jolie

Desço sobre os ombros, largos e astutos,
sob teus cotovelos aveludados,
antebraços de contornos leves,
mãos pequenas e dedos bicolores,
tua barriga austera, do riso ao umbigo,
do vértice de sua bacia, e o delgar de tuas pequenas coxas.
Me viro a dentro, sobre suas pintas escondidas,
parar em teus joelhos, cheios de lembranças
cicatrizadas. Alegrias e tormentos, saudades.
E em tua perna fina me contorço, beijo teu
palmar dos pés, até que seu dedão reclama
a cócega, e seu rosto exprime o sorriso, para
onde retorno, completo...
para seguir novamente teu rumo.

Chegando

Estalou os dedos e dormiu.
se foram léguas,
águas e pessoas,
caminhadas e pipas.

além do céu e os arbustos,
as praças e crianças,
as linhas amarelas ao chão
e o crepuscular céu.

e na janela dorme tranquila,
dorme menina, dorme.
mãos juntas, unidas.. uniformes.
pés separados, munidos de forças.

e chegar, chegando, chegou.
Para seu ventre adentrar
é só não mais o farol enxergar,
quando ele brincar de esconder,
lá estará, - Itapoã - breve.

E acordarás, saberás..
que chegastes.

diga-me,
onde foi que
pequei?

se rezo ao meio
dia, rezo ao final do dia,
e agradeço por tudo
que conquistei?

planejo com parcimônia,
me engrandeço com humildade,
permaneço na vida cotidiana..
sigo a prece, o rogar, pedindo apenas
a tal da absolvição.

Onde pequei, meu pai?

Vapt Vupt

tem dias
que os dias,
parecem voar.

e flanam,
deságuam..
até terminar.

só passam,
inimigos,
do rosto macio.

e vão sem dizer,
até mais..
até logo,
Já vou!

Quinto dia

..e no quinto dia,
suas mãos eram minhas,
e as minhas, ainda minhas.

seus olhos eram meus,
e meus olhos, eram meus.

sua boca era minha,
e minha boca, só minha.

seu coração era seu,
e o meu.. a quem pertence?

Já não.

Já não mando cartas,
pois teus olhos não merecem
os selos mais baratos.

Já não envio sorrisos,
pois tua divida vã não
abraça nenhuma virtude.

Já não planto ervilhas,
espero pelo milho,
que logo chegará.

Já rasguei teu testamento,
no fundo da lixeira está.

E ficará.

Volta aqui

pelos seus cabelos,
pelo teu anel na mão direita,
pela tua fitinha desgastada.
pela tua inquietude,
pela sua curiosidade,
pelos teus olhos em mim,
pela tua dúvida,
pelo teu jeito..
pelo teu imitar,
pelos teus lábios,
pela tua barba..
pela tua blusa preta,
pela tua calça surrada...
pelo teu olhar de adeus..

Mas volta aqui, volta.

Alvoroço

Como pude de chinelos andar quilômetros pela estrada?
Entre o que acontecera, segui meu rumo sozinha,
no meio do nada, na beira do furdunço..
de onde andei quilômetros, de onde fugi do alvoroço.
E todos viam a mochila lilás, e o macaco a rodopiar.
Até chegar onde nem pudera pensar, onde cheguei
e onde todos os dias chego, no horário certinho..
pra poder viajar novamente.

E mais furdunço, e mais gente.

Não Creio

Não creio que Outubro,
já não é novidade,
e que a minha saudade,
ficou no mês passado.

Saudade do lembrar,
saudade do pensar..


ahh Outubro,
chega logo!