terça-feira, dezembro 9

Josephine.

Josephine, flor esquecida do jardim dos pássaros. Flor de orvalho rente e textura angular, de haste fina e adornos simples. Flor de anáguas cálidas, mas que se prende em superfície a um ar embalsamado. Em teus dias, horas demais e certezas vãs na órbita de teu mundo, Josephine realça sua vida em sua desmedida e conturbada comoção imaginária. Sobrevive de amor a um único ser cujo molde lhe abraça a liberdade, o céu e ela, eram longínquos de um grande amor em laço eterno. Mas flor de jardim cercado jamais visita a esfera do mundo, muito menos, do amor liberto.
Cantava suas alegrias e tristezas em um desatar de nós estranho, cada vez que uma de suas pétalas era desamarrada, ela tecia sob seu ímpeto um desejo de construir uma desmedida história, onde Josephine se rendia a uma canção de amor qualquer, e deixava de se enraizar sobre as ervas daninhas. E em que, encontrava com o pássaro de teus sonhos, um amor em vendaval de estrelas distantes. Ou talvez, era vez da tristeza, e só a mais pálida das flores poderia redigir um consolo duradouro. E Josephine era de tudo a mais triste das flores, em condição de um bulbo sedento de tristes histórias, sadomizando assim tuas folhas mínimas. Pulsava por hora e desandava por muitas, seu guia de todos os dias e algoz de sua dívida eterna, Josephine obedecia a clausura de viver em si, para si o mundo era sonhar demais, para os outros, Josephine apenas uma flor sem mais espetáculos.
No jardim acompanhava as manhãs o tear das rosas, um luminescente raiar do dia em que todas elas exalavam o melhor de toda sua espetacular e distinta vida, existem flores que nasceram para exuberantes papéis, e das rosas Josephine tinha um absurdo contemplar. Logo a esquerda das rosas a grama era mais verde, e os pássaros eram agraciados pelo brilhar do orvalho sob tuas pétalas cintilantes, o edem posou e deixou que o mundo dissesse adeus. E agraciadas, uma a uma com a vida de longas condições, condições essas de esmero e adornos, elas seguiam a contornar o mundo com uma beleza singular e radiante. Atraindo o liberto ser que de outra lhe retiam os dias.
Perto do gradear estava Josephine, a última de sua espécie. Pois a pouco lhe dissera adeus a penúltima, que fora passear sobre as mãos de um arroubo juvenil. A sua direita, um imenso Copo de leite, audacioso de tão grande, eterno em si por seu reter do orvalho, minucioso em suas poucas palavras e de súbito, as vezes um grande produtor de horas de pensamentos. Residia nos dias de Josephine como uma razão distante, que por vezes lhe visitara a face. Por muitas, em que esqueceu de acordar, o esguio ser lhe derramava um bom dia, em litros fictícios.
A mais deles ao redor de Josephine, só não lhe aparentam bons presságios, pois flor que não brilha não é boa coisa, ditos em reservado, porém o saber de tal fofoca fora conhecido. De certo ela se virava a esquerda as manhãs, de certo que sim. Lá estava o Girassol, radiante e altivo! Grande flor de prosperidade e renascer, lhe regava os dias com fortes palavras de otimismo, e lhe trazia um pouco de vida as manhãs, quando se esquecia de viver. Mas aos dias chuvosos, daí sim o pessimismo lhe engolia, pois o Girassol empobrecia seu ser quando os céus se trancavam. Então nos dias de chuva dava a ressalva a todo seu desgosto matutino.
De certo que não conhecia as Camélias, nem as Gardênias, tão pouco os Crisântemos. Tinha medo de parecer tola e ineficaz em aparecer-lhes, então, fazia da forma mais fácil, reprimia-se. Ela gostava mesmo era de conversar com as formigas, mesmo que as vezes as via mordiscar suas pétalas desatadas, relembrando algo que esquecera. Mas as formigas eram dóceis, diziam as novidades do jardim dos pássaros, e à antenava, minúscula flor de seu liberto amado. Só que o conversar jamais substituía o doce, por isso pairavam ao encontro do néctar mais próximo. Não ligava, cada um erguia sua vida como bem entendesse, pensava.
Um dia esqueceu de acordar, não abriu-lhe as pétalas ao sol. Então tomara o gosto do orvalho gélido as seis, quase lhe derrubou toda fronte. E acordou com ar de divergência, salpicando a terra com as gotas madrugais. E lá de cima o mestre das alturas lhe disse para acordar, pois o dia nasceu e o mundo está girando novamente. Quem dirá a mim que horas acordar? Josephine teimosa como suas pequenas raízes, nunca desplantavam de um mesmo lugar, e se fora o caso de viajar pra outros terrenos, morreria inóspita. Enraivada e submersa, resmungou e se contorceu novamente, e sem perceber, uma pétala caíra impune. O Girassol cantava ao dia mais belo, as Rosas brilhavam no caloroso dia, Violetas, Margaridas, Minhocas e Borboletas cantavam a canção da Primavera, e talvez Josephine acordasse, sob o barulho chateante. E com retorcidas pétalas ela se abre, o dia a invade e os pássaros estão próximos. Um susto! Logo se mantém rente e arredonda suas pétalas. Seu amado lhe olhara de rápido sentir, e um segundo bastou para a teimosia fingir não perceber. Até nos amores ela não sabia de que modo, modos teria uma flor assim? Para talvez ser a viajante de tuas pequenas garras libertas. E então o momento se esvaiu, mais uma vez o voo foi rápido e doloroso, mais uma vez uma pétala despencara.
Então resolveu não mais viver de sonhos fúteis, decidiu exaurir-se de si mesma. Virar uma trepadeira e sumir no mundo, em seu mundo de artifícios inexatos. E até em sua fuga se exprimiu o dom da frustração, lhe prometera o mundo, e ganhastes a mesmice. Derramou-se em três pétalas, quase parecia seu pulsar incitante, mas escondia-o de todos, todos.
Assim que o dia se foi, passou acordada a contemplar sua humilhante vida, mas na única noite em que não dormira, o luar contemplou sua vida, e brilhou na noite a flor que não tinha cor. Talvez fosse sonho ou pura ilusão, mas dedilhou em mil palavras latentes a felicidade de se esquecer do esquecimento, viva enfim estara. Um tom de inebriante, a noite sou quem posso e cada vez mais! Retificou em duas ou três palavras depois, pois menos era sempre Josephine. E quem vira tal feito? O jardim estava fechado, as outras flores entorpecidas em si mesmas, os pássaros em seus ninhos, e Josephine? Sonhando em planícies estelares.
A noite era sua companheira, e nem dormira de tanta agonia. Pois o dia logo nascera e todos poderiam ver seu brilhar, mas espere, a lua já despediu-se, e seu espasmo brilhante se foi. E na manhã fechou-se novamente.
Josephine fadou seus dias a um eterno diluir de sua alma, a noite era viva e brilhante, mas ao dia, como construirá sua avidez? E assim passou a suspirar em vão, porém agora a esperança lhe contemplara ao pensar em como seria num eclipse...

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