quarta-feira, dezembro 12

Estação

Saio de casa às onze e quarenta, tento pegar o quarenta e sete para quem sabe assim chegar com um pouco de sorte na Estação, cedo de preferência ao rumo do sessenta e um, meu único e viavel destino.
Ao chegar por lá, a cidade inteira passa e de passagem os observo.
Pessoas por todos os lados, um mar de gente que me engole todos os dias quando por lá apareço. Chegam do trabalho cansadas, há também aqueles que vão curtir a noitada, os estudantes, vendedores de doces,salgados e a boa e velha pipoca. Do estudante de direito apressado à moça de sorriso bonito que trabalha de faxineira no Flamengo.
Quando me vejo dentro da estação percebo mundos diferentes, vidas que se contrapõem se trançam,se fitam e meramente por obra do destino, se cruzam.
Há duas entradas centrais e os envoltórios fazem com o que os onibus possam
transitar para a onde fazem seus horários, onde os motoristas e cobradores descansam.
Engraçado é perceber todas elas andando, conversando e principalmente pedindo informações à todo o tempo. Uns curiosos na fila, prestam atenção na conversa das meninas que falam alto demais para não se prestar a ouvi-las. Conversam sobre a vida de uma tal de Débora, que se apaixonou pelo namorado da vizinha do seu condomínio, Débora essa que crucificada está.
Bem perto dali um policial seguia para sua divisão, altivo como todos eles deveriam ser. Seguia para uma pequena casinha onde funciona à quadragésima quinta dp, que mantém a paz e a ordem na Estação.
Antes de chegar à seu destino dá pra se notar um companheiro malhadinho e serelepe que o persegue. Abana sua cauda e coça a orelha esquerda, sua coceira era por muitas vezes o motivo de não conseguir acompanha-lo, mas toda vez que avistava o policial um pouquinho distante simplesmente dava um pinote e corria para alcança-lo. Engraçado, pareciam amigos e sem que se quer tenha percebido, adentram a pequena casinha.
Após perde-los de vista e ganhar um pequeno sorriso, olho para os carros que passam fora da Estação, eles passam paralelamente sobre duas pistas. As vezes, os observo das passarelas e a vertigem me toma o cérebro.
De forma inesperada se aproxima um carro à margem da entrada, ele para e uma garota se despede rapidamente. E mais abruptamente é a saída do carro pelo mundo à fora, sabe lá Deus pra onde.
Se despede com o balançar dos dedos, se é que o detentor do carro pudesse ver. Uma garota de mais ou menos vinte, cabelos longos e short minúsculo e quem sabe se por assim dizer, um pano que lhe cobre os seios.
No nariz e na barriga, uma estrela brilhante que ofusca os olhos dos residentes das filas naquele dia tão ensolarado. Era meio dia, finalmente.
Ela passa e não dá bola nem pra si mesma, só faz questão de guardar seu papel amassado no bolso e assim quem sabe, seguir em frente.
Sem querer, me esbarro com um homem que o tempo fez questão de mostrar quem é. Um homem de muletas que arrastava um dos pés, inchado. Calçava uma sandália amarela em um deles e no outro um tenis azul marinho. Seus cabelos eram grandes e grisalhos sua pele queimada de sol e seus olhos azuis cintilantes, pedindo ajuda à todos nós.
Lhe peço desculpas e lhe digo que infelizmente não tenho trocado mas penso no pequeno pacote de biscoito que guardo na mochila e não exito em dar-lhe. Ele sorri, agradece e sem mais nem menos volta a arrastar-se por ai. Como ele, volto a seguir meu rumo à espera do meu onibus.
O Neruda consola minhas mãos, tristes por terem de sair pra trabalhar num dia tão bonito.
Voltando à mim, olho para meus pés inquietos e sem mais nem menos curvo meu olhar para o nada, aliás, há algo de interessante por lá. Uma roda gigante. Sim, o parque estava na cidade, e ao longo da estação dava pra se enxergar um pedaço da "Giant Wheel", brilhante às noites como todo o resto do parque. Engraçado, mas apaixonar-se por algo assim é inevitável. Perceber que a cidade toda nessa época do ano se enfeita - é Natal afinal - torna mais bonito de se ver.
E sem querer me despeço, o sessenta e um chega a meu terminal, rápido e indolor aos meus observados. Sem ao menos me pedir licença. Me deixando sem saber do desfecho de minha própria história, essa quem sabe, contada por outro observador.

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