sexta-feira, março 7

Velho Espelho

Assim que adentrei, meus olhos seguiram as longas e espessas portas. Das quais se misturavam formatos nunca antes vistos, rostos, figuras expressivas em seu auto-relevo. Escadas para o palacete e logo adentramos, uma só palavra me deduzia prisão; Estados unidos do Brazil, soou meio ridículo, quem sabe, um tapa na cara. Mal entendi.
Já passado o susto, recolhi minha atenção aos quadros que tanto me fazem lembrar de experiências passadas, infância,nostalgia... recortes da vida que por vezes, utilizamos para descrever um quadro, sobre o que achamos, enfim, vemos. Me perdi sob muitos deles, não só os quadros, mas a prataria, os utensílios antigos, camas, leques, jóias,cortinas luxuosas ,porcelana, urnas, estatuetas, um velho piano minúsculo e uma luminária de anjos reluzentes. Tudo me era posto de forma tão extraordinária que quando pude enfim, achar algo tão simples, tão banal em nossas vidas, que passamos todos os dias a nos envaidecer sobre ele, narcisos como nunca, daí então, cai em mim de pensar sobre um velho espelho.
Quantas e quantas vezes, aquele velho espelho refletiu pessoas tão diversas? Pensei. Momentos únicos, sussurro no meio da noite, o esvair de cabelos a seus pés, os objetos em sua frente dispostos, os olhares petulantes ou sarcasmo à si mesmo. Quantas vezes, aquele velho espelho pode refletir almas inquietas em singulares momentos da história, onde todos aqueles refletidos se foram, não há registo de sua passagem sobre os outros móveis ou até mesmo sobre aquele espelho, que tanto os reluziu de forma exata. Se houvesse acervo dentro daquele espelho, o que ele poderia me mostrar? Se agora só posso ver a minha imagem, através do anos outras que ali residiam talvez não questionando da mesma forma, porém, ao mesmo tempo perdidos a adentrar seus olhares e se redescobrir, como fiz.
Se pudesse ver o que ele refletira, poderia saber de segredos das mais belas moças da corte ou as aventureiras vivências de um belo cavalheiro. Se o espelho pudesse acervo nos mostrar, como seriam as conversas à frente dele? O que diriam aqueles que por muitas, se viram com olhos opacos sobre o espelho, perguntando à si como lhe cabes em corpo, espírito e imagem perfeita de si, num objeto. Como seriam as mulheres, que por horas nem respiravam para prender os espartilhos, arrumar os longos cabelos ou olhar-se petulante ao velho espelho. Como seriam os homens, a pentear os bigodes, arrumar a gravata borboleta e ajeitar a aba se seus chapéus.
E como seriam, todos eles a passar por aquele móvel, que por anos refletiu tantas vidas e hoje, nada se fez para me dizer o que lhe é acervo, mas, mesmo assim me fez pensar sobre tantas, tantas possibilidades...

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