terça-feira, fevereiro 26

Instinto

Bem como nasceu, quando os olhos abriu, quando mamou sem ao menos saber o que estava fazendo e mesmo assim, precisando descobrir. Quando aprendeu a andar, grunir, latir, lamber, morder os dedos, os sapatos, as cortinas, os edredons, as sandálias, e tudo que no chão se possa manter, por segundos. Até ela poder descobrir.
Mesmo quando não sabia, o que eram aqueles dois potinhos coloridos com bolinhas verdes e vermelhas, bolinhas misturadas em um pote e no outro algo que lhe recordava o leite que tanto puxou da mamãe Mel. Mesmo que não soubesse, curiosa lá estava a fazer um barulhinho esquisito e engraçado quando come, meio parecido quando comemos amendoim japonês.
Quando não sabia subir na cama, no sofá e na cadeira. Aí sim, aprendeu a moeda de troca do mundo dos filhotes ou até mesmo das crianças, que compartilham dessa maravilhosa ferramenta para conseguir um colo, um biscoito a mais ou que, simplesmente, ponhamos ela na cama. Chorava para subir à cama, chorava para dormir, chorava para comer, chorava quando estava sozinha, chorava acompanhada, chorava pra tomar banho, pra pentear o pelo,chorava se tomássemos a sandália de seus dentinhos afiados, chorava se não a dávamos atenção, chorava se deixássemos ela no colo por muito tempo.. enfim, era um chorar esperto, cheio de aspirações futuras e um certo querer grandioso e astuto.
Agora me deparo com seu latido, aprendeu a latir aos poucos. Mas quando aprendeu, uniu o chororo ao latido de "Ei! Presta atenção.. eu to falando porra!". Aprendeu também que quando pegamos a bolsa, vamos sair, quando mexemos na chave, vamos sair e quando usamos perfume, definitivamente, vamos sair.
Dorme encostada na barriga de qualquer um, as vezes recosta a cabeça sobre travesseiros e braços, sente uma saudade imensa de qualquer um que deixe a casa e é simplesmente amável com todos os bípedes que a ela digam o quanto é fofinha. Não sei como, de que maneira astuta.. aprendeu que tem de perseguir pássaros, comer formigas e seguir lagartixas. Os pássaros por vezes, curtem com a cara dela, chegam ao quintal nas manhãs ou nos finais de tarde - sempre em duplas ou trios - e se aposentam por segundos ao esperar ela os perceber, parece que conversam algo do tipo "Ei, cadê aquela quadrúpede que sempre nos persegue? Hoje vou voar de uma forma diferente.. só pra deixar ela com raiva". Cansei de ve-la persegui-los, certa vez ao ler um jornal no chão, percebi que ela levemente saia do meu lado, abaixava-se um pouco e seus passinhos
eram regrados, calmos e articulados. Observa-os por alguns segundos e finalmente corre ao encontro deles, sem nenhum sucesso é claro.
Houve épocas, em que cavava buracos enormes no jardim do quintal. Foi uma época de muita sujeira, objetos que desapareceram e foram descobertos quando houve chuva e quem sabe futuramente, descobrirei outros artefatos maravilhosos. E no mesmo quintal por quantas vezes, trouxe as pedras-sabão do quintal, colocou sobre a cama, a cozinha, a sala, a mesa, o tapete, a escada e em qualquer lugar... Depois que a febre - bendita bolinha rosa, ou maldita ? quem sabe - chegou, ela esqueceu um pouco das pedras, mas, como tudo que é novo perde um dia o seu glamour, ela também, das pedrinhas não esqueceu.
Toma sol todas as manhãs e ao meio dia, as vezes vai as tardes para sentir o vento ou a brisa que a toma na varanda, ao vigiar o portão. Dele ela é amicíssima de uma gretinha que se forma entre o portão e o muro, na qual vê as pessoas que passam na rua.
Fica nervosa, eufórica e louca quando mexemos rapidamente as mãos, corremos ou puxamos o seu rabinho minúsculo. Quando quer algo de nós, além do choro, do latido, agora aprendeu uma nova técnica de persuasão e retórica, raspar nossas pernas com suas garras de leoa(Yorkshire, heheh).
Apesar de toda a forma que aprendeu as coisas, sempre foi de algo que de dentro lhe palpitava, seja lá os seus pequenos genes com informações sobre chorar, grunir, raspar, cavar.. Seja lá de que forma aprendeu nesses quase dois anos de idade, de um jeito tão auto-didático a explicar seu único e gradual amigo, o instinto.

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